Empatia Social

Estávamos nas montanhas do Chile, conduzindo um retiro de Comunicação Não Violenta (CNV), com pessoas de diferentes contextos socioeconômicos, culturais e raciais. 

Numa das rodas de empatia, um rapaz indígena, do povo Mapuche expressou como se sentia mal em certos ambientes onde percebia preconceito no olhar de pessoas brancas. Os ouvintes, atentos, realizaram uma série de ‘checagens empáticas’, procurando confirmar o entendimento do que escutavam e buscando se conectar com os sentimentos e necessidades, expressos além das palavras faladas.

A prática da empatia é uma das bases da CNV. É uma habilidade essencial para construção de diálogos significativos e transformação de conflitos. Segundo o psicólogo Carl Rogers, “o estado de empatia consiste em aperceber-se com precisão do quadro de referências interno de outra pessoa, juntamente com os componentes emocionais e os significados a ele pertencentes, como se fôssemos a outra pessoa, sem perder jamais a condição de ‘como se’”. Significa penetrar no mundo processual do outro, sem julgar, servindo de companhia confiável em seu mundo interior.

Após o rapaz se sentir plenamente escutado, os ouvintes expressaram como sua partilha chegava até eles. A expressão autêntica é outra habilidade essencial da CNV, tão importante quanto a empatia. Consiste em nos conectarmos profundamente com nós mesmos e expressarmos com vulnerabilidade e honestidade nossos sentimentos e necessidades.

Neste momento, uma mulher questionou se as pessoas brancas de fato olhavam para ele com preconceito ou se essa era apenas sua interpretação. Sua fala causou certo alvoroço. Algumas pessoas concordaram e outras se revoltaram com o questionamento. 

No discurso psicológico ocidental, a empatia foca em conhecer o mundo interior da pessoa, muitas vezes deixando de lado as condições históricas, estruturais e sistêmicas. No livro “Empatia Social”, Elizabeth A. Segal diz que quando somos socialmente empáticos, também consideramos as circunstâncias sociais, econômicas e políticas que moldou a pessoa.

A Empatia Social integra uma visão empática no nível interpessoal com uma compreensão do contexto social mais amplo. 

A sensação de desconforto e de não se sentir bem vindo em ambientes predominantemente brancos não era apenas uma sensação subjetiva e individual do rapaz que esteve em nosso retiro. Essa percepção se baseia em fatos concretos. Durante séculos o povo Mapuche foi massacrado e expulso de suas terras sagradas. Ainda hoje não houve reparação histórica e o movimento Mapuche luta pela recuperação de seu território ancestral, por mudanças constitucionais em prol dos direitos indígenas e reconhecimento por parte dos Estados de suas especificidades culturais.

Todo esse contexto de expulsão e discriminação pelo qual passaram gerações, e também de luta por dignidade e respeito, compõem e integram a identidade e a experiência psicológica das pessoas afetadas. Deixar de lado a influência desses fatores históricos é compreender o indivíduo apenas parcialmente, de maneira limitada e reduzida.

Outra dimensão da Empatia Social, de acordo com Maureen O’hara, estudiosa sobre o tema, é que ela também nos convida a “ouvir a consciência coletiva, escutar o que nossas comunidades, mundos sociais e naturais estão nos chamando a fazer enquanto pessoas; ler seus sinais, ouvir suas dores e encontrar seus pontos de transformação”. Assim, podemos criar um mundo cada vez mais saudável, que cuida de toda a vida.

Texto de Sandra Caselato publicado originalmente na revista Viva Saúde.

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